sexta-feira, 10 de junho de 2011

Quando na Índia, afine como os indianos

Como muitos sabem, uma de minhas principais fontes de renda é o trabalho que realizo como cenotécnico/técnico de iluminação autônomo pro SESC Vila Mariana.

Há poucas semanas, ocorreu um evento por lá de uma semana de duração de homenagem à cultura indiana. No primeiro dia da programação, haviam dois eventos escalados para o teatro: uma apresentação de música e outra de dança. A de música teria iluminação de Juarez Adriano, grande técnico e colega de trabalho (um dos indivíduos que auxiliou minha vinda a São Paulo). A dança, por sua vez, teria iluminação de um indiano cujo nome eu esqueci. Já antecipando a dificuldade de comunicação com o cidadão, e considerando que ele era o convidado, Juarez decide montar a luz do cara e adaptar sua luz.

Começamos os trabalhos e logo assumi a função de tradutor por ser o que entendia um pouco melhor o parco inglês britânico de forte sotaque indiano do nosso convidado. Muitos desentendimentos depois, surge um outro indivíduo que se apresenta com um inglês um pouco melhor como um dos bailarinos da dança. Ele me ajuda a entender um pouco o iluminador e vamos conversando.

Paremos agora pra apontar um detalhe na história. O Juarez havia colocado no chão junto à rotunda uma bateria de refletores PAR de forma a desenhar um leque com as cores da bandeira da Índia. O diferencial é que ele fez um leque assimétrico, deslocando-o todo para a esquerda e, portanto, criando faixos de tamanhos variados no tecido.

E qual não foi minha surpresa quando o bailarino indiano sugeriu que o leque fosse centralizado e simétrico, pois ele considerava a proposta do Juarez "óbvia demais". Agora, só recapitulando pra ter certeza de que ninguém perdeu nada: ele considerava a assimetria óbvia e a simetria original. Isso me deixou intrigado o resto da noite. Fiquei pensando nas diferenças culturais, nas motivações, nas diferentes concepções artísticas entre os povos. Como, pra nós do ocidente, os valores são outros. E com isso, fiquei curioso sobre a luz que estava sendo montada e passei a prestar mais atenção em seu desenho.

Se dissesse que gostei, mentiria. Haviam ali diversos elementos que eu faria diferente. Mas de alguma forma, aquela luz que pra mim era bem estranha e disforme, fazia algum sentido no contexto do espetáculo. Fico me perguntando se, caso tivéssemos uma melhor comunicação, a luz dele não poderia ter ficado melhor acabada, mais desenvolvida. O que vi foram focos completamente fora de simetria e sem nenhum rigor de afinação (foco, tamanho), uma operação bastante dinâmica, quase como se ele procurasse os dançarinos com a luz e, muitas vezes, um excesso de luz com contras, frentes e laterias de cores variadas ligadas a full simultaneamente.

Quanto à dança em si, gostei bastante das coreografias e da cultura ali apresentada, com os aspectos religiosos/mitológicos deles fortemente presentes. Só senti que, ao contrário do que o cônsul indiano afirmara, eles não enviaram "o seu melhor". Tive a impressão de que o corpo de dançarinos era composto por jovens inexperientes. A imprecisão, a assincronia e o desequilíbrio eram constantes.

Ou seria isso, junto à luz, parte de um conceito maior?

Câmbio, B.O.

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